Há tempos venho me questionando sobre esse sentimento de culpa quando me dou o direito de ficar à toa, escrever, ler, resolver desafios de sudoku, sentar e apreciar meu quintal... Penso que tenho tanta coisa pra fazer que esse tempo de "ócio" não é possível. Mesmo quando entro aqui e fico lendo artigos interessantes, me cobro por não estar trabalhando no meu ateliê. Muitas vezes, coloco o link no favoritos e decido ler numa outra hora, mas fico com a sensação de que estou perdendo alguma coisa. O jornal de domingo rola durante a semana, até que eu encontre um tempo pra ler as partes que me interessam, antes que o do próximo domingo venha se juntar a ele. Vivo numa briga cruel entre querer fazer tudo ao mesmo tempo e sentir que não é possível fazê-lo. E isso gera insatisfação, angústia...
Questionei-me , por diversas vezes, se isso é algo inerente a mim, ávida por informações e por querer dar conta de tudo ao meu redor, ou se é um "mal do século". Mas encontrei outras pessoas com a mesma sensação e, no domingo retrasado, 26 de abril, a Revista O Globo, que acompanha o jornal, trouxe uma reportagem que me chamou atenção:Tempo, tempo, tempo. Como era muito grande, mais de 3 páginas, fiquei andando com ela pra lá e pra cá nesses dias todos. Hoje resolvi ler na íntegra. O artigo trata exatamente dessa falta de tempo, dessa correria alucinada , da quantidade de informações que surgem a cada segundo e da qual não damos conta e que resulta numa "angústia contemporânea" (eu chamo de "angústia coletiva").
Questionei-me , por diversas vezes, se isso é algo inerente a mim, ávida por informações e por querer dar conta de tudo ao meu redor, ou se é um "mal do século". Mas encontrei outras pessoas com a mesma sensação e, no domingo retrasado, 26 de abril, a Revista O Globo, que acompanha o jornal, trouxe uma reportagem que me chamou atenção:Tempo, tempo, tempo. Como era muito grande, mais de 3 páginas, fiquei andando com ela pra lá e pra cá nesses dias todos. Hoje resolvi ler na íntegra. O artigo trata exatamente dessa falta de tempo, dessa correria alucinada , da quantidade de informações que surgem a cada segundo e da qual não damos conta e que resulta numa "angústia contemporânea" (eu chamo de "angústia coletiva").
SEgundo a autora, Karla Moreira, baseada no pensamento de Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, a "solução estaria na capacidade de parar para refletir." Pois nós só assimilamos as informações, não damos conta e não refletimos mais sobre nada. Ela traça um paralelo entre conhecimento explícito ("informação pura e simples") e conhecimento tácito ("aquele que só o indivíduo pode fazer"), numa comparação interessante com uma receita de bolo: "não dá para apenas saber a receita do bolo. É preciso desenvolver a habilidade de fazer o bolo ficar gostoso." Karla cita Marcos Cavalcanti, matemático e pesquisador da COPPE/UFRJ:
"- Não adianta só ter informação. Um computador manipula melhor do que qualquer ser humano o conhecimento explícito. O que o computador não sabe é se está faltando uma pitada de sal para reaçar o doce do bolo. E esse tipo de conhecimento só é gerado com reflexão, concentração, investimento pessoal. " E ele continua: "- Aí entra a questão do tempo. Em vez de correr para não perder nada, o ideal nesse momento é consumir pouca informação e parar para pensar. As pessoas que desenvolverem a capacidade de gerar conhecimento tácito estarão bem no futuro, valorizadas, insubstituíveis. A sociedade da informação está migrando para a sociedade do conhecimento. Isso é um fato. O frenesi de informações causa angústia, insatisfação, ansiedade e nenhum conteúdo. O que está faltando na vida das pessoas é espaço, é se dar um tempo."
O artigo todo é muito bom, deve ser lido na íntegra. E é um bom assunto para discussões infindáveis, porque é necessário repensar tudo, ou estaremos fadados a nos consumir dia após dia por essa angústia de querer tudo ao mesmo tempo agora.É o preço da "Modernidade líquida", como denomina Bauman?
REgistro aqui a entrevista de Bauman, com a qual ela fecha o artigo:
"Zigmunt Bauman: 'Estamos constantemente correndo atrás. O que ninguém sabe é correndo atrás de quê'
Publicada em 26/04/2009 às 11h21mKarla Monteiro no O Globo
RIO - Professor emérito das universidades de Leeds e de Varsóvia, 83 anos, autor de best-sellers como "O mal-estar da pós-modernidade", "Modernidade líquida" e "Amor líquido", o sociólogo polonês Zigmunt Bauman é um ferrenho analista das consequências sociais do que conhecemos como progresso. Nesta entrevista por email, ele discorreu sobre a correria do nosso tempo com o seu jeito claro, objetivo e muito particular.
O GLOBO: O que mudou na nossa percepção do tempo com o avanço das tecnologias de comunicação? Por que andamos com tanta pressa?
ZIGMUNT BAUMAN: Na sociedade contemporânea, somos treinados desde a infância a viver com pressa. O mundo, como somos induzidos a acreditar, tornou-se um contêiner sem fundo de coisas a serem consumidas e aproveitadas. A arte de viver consiste em esticar o tempo além do limite para encaixar a maior quantidade possível de sensações excitantes no nosso dia-a-dia. Essas sensações vêm e vão. E desaparecem tão rapidamente quanto emergem, seguidas sempre de novas sensações a se perseguir. A pressa - e o vazio - é fruto disso, das oportunidades que não podemos perder. Elas são infinitas se acreditamos nelas.
O GLOBO: Como chegamos a esse ponto de estresse e, talvez, cegueira?
ZIGMUNT BAUMAN: Cegueira? Depende de como você olha para o comportamento atual. Muitas pessoas, especialmente os jovens que nunca viram outras formas de viver, diriam que eles mantêm os olhos e os ouvidos muito abertos, e estão muito mais alertas e vigilantes do que os mais velhos, que viveram épocas menos frenéticas. Eles diriam mais: que estando tão alertas, e rapidamente pegando no ar as possibilidades, eles são os sábios, os que sabem viver a sua época. Esse ritmo é o ritmo do tempo que habitam, um tempo que abortou o que eu chamaria de tempo livre, o tempo não preenchido com o consumo de imagens, sons, gostos e sensações táteis. Somos dependentes dos estímulos externos: as mensagens que chegam no celular, o iPod, as conversas pela internet. A alternativa para o tempo não preenchido com esses estímulos não é mais vista como tempo de reflexão, de auto-questionamento, de conversa consigo mesmo, mas de tédio. Nós somos seres que se escoram no que vem de fora. Perdemos a capacidade de nos auto-estimular. Estar sozinho - a liberdade de gastar o tempo com nossos próprios pensamentos, perseguida e sonhada por nossos ancestrais - é identificado hoje com solidão, com abandono, com a sensação de não pertencer. No MySpace, no Facebook ou no Twitter, o ser humano enfim conseguiu abolir a solidão, o olho no olho consigo mesmo.
O GLOBO: O que o senhor apontaria como o epicentro da aceleração que tornou o mundo tão rápido e tão raso ao mesmo tempo?
ZIGMUNT BAUMAN: A sociedade pegou a estrada de uma vida orientada somente pelo consumo. O ser humano autossuficiente e satisfeito nas suas necessidades materiais ou espirituais perdeu o jogo para o mercado. Qualquer caminho que satisfaça os desejos e que não esteja ligado a compras e lucros é amaldiçoado. Vivemos o tempo do conecta e desconecta.
O GLOBO: Quando visitamos lugares como o Tibete temos a impressão de que eles vivem outro tempo, que têm um relógio diferente do nosso. Quem está mais próximo do tempo real, os tibetanos ou os nova-iorquinos, por exemplo?
ZIGMUNT BAUMAN:O tempo jorra em todos os lugares. E nós envelhecemos no Tibete ou em Nova York. Mas a experiência da passagem do tempo nós organizamos de maneira diferente, dependendo da sociedade em que estamos inseridos. Na maior parte da história da Humanidade, tínhamos basicamente duas formas de organização: o tempo cíclico, que se repete dia após dia, ano após ano, vivido pelas sociedades agrárias, como o Tibete. E o tempo linear, que marcha, move em direção ao futuro, dominante nas sociedades industriais e que expressa essa ideia de modernidade, progresso. O que estamos percebendo em Nova York - ou no Rio - é uma terceira e relativamente nova organização do tempo, que ganha terreno no que eu chamo de modernidade líquida: uma forma de vivenciar a passagem do tempo que não é nem cíclica e nem linear, um tempo sem seta, sem direção, dissipado numa infinidade de momentos, cada um deles episódico, fechado e curto, apenas frouxamente conectado com o momento anterior ou o seguinte, numa sucessão caótica. As oportunidades são imprevisíveis e incontroláveis. Então a vigilância sem trégua parece imprescindível. Esse tempo da modernidade líquida gera ansiedade e a sensação de ter perdido algo. Não importa o quanto tentamos, nunca estaremos em dia com o que aparentemente nos é oferecido. Vivemos um tempo em que estamos constantemente correndo atrás. O que ninguém sabe é correndo atrás de quê. "
Pois é, não estou sozinha...
Uma correção: No artigo o nome do grande pensador está com i - Zigmunt, mas no livro dele, que eu tenho - O Mal-estar da pós-modernidade, da Zahar, consta y-Zygmunt. Eis um assunto interessante para estudiosos da Crítica TExtual.
4 comentários:
Então, querida Veronica, vamos nos dar um tempo precioso para a nossa ociosidade, e vamos, pelo menos, fazer força para curtí-lo. Fazer ... nada, apenas ficar sozinhas conosco e ... pensar, respirar profundamente, e agradecer o nosso tempo de vida.
Grande beijo,
Rosane.
Prezada Verônica, vivemos uma época de iguais e superficiais, onde tudo é muito rápido e as idéias são cada vez mais descartáveis. Imprimimos um rítimo em nossas vidas, que os antepassados jamais imaginariam. A obrigação criada, de ter que se ficar sabendo de tudo que acontece nesta aldeia global, gerada pela ‘superinformação’, termina sendo uma imposição da vida moderna, virando uma ditadura midiática. As vezes eu me pergunto: um dia, não muito distante, quem irá lê tanta notícia. Antes ao acordar ouvíamos o galo cantar, os pássaros e o vento a balançar as folhas das árvores e até dava tempo para acompanhar o dia clareando, com o sol subindo do horizonte. Hoje acordamos com um despertador de som estridente, que nos expulsa da cama. Levantamos já com o celular na mão. Na rua o barulho do trânsito já pode ser ouvido, o cheiro de monóxido de carbono já pode ser sentido. Ligamos o rádio, TV e computador. Tomamos banho e escovamos os dentes com o radinho ali pendurado, rapidamente no café da manhã passamos os olhos no jornal do dia, ao sair da mesa uma passadinha pelo computador para olhar e-mails e alguns sites, quando descobrimos que já estamos atrasados. É o começo da maratona, que só terminará quando formos dormir já tarde da noite. É que ficamos horas e horas navegando e tentando colocar as coisas em dia, atualizando os blogs e entrando em contato pelo: msn, orkute, twitter e sempre adiando a hora de dormir. Hoje é raro encontrarmos uma pessoa que não reclame de alguma doença e que não esteja tomando mais de um remédio. Todo ser humano tem um órgão que está mais susceptível a ser machucado pela tensão do dia-a-dia e termina o coração sendo o mais vulnerável. Algemados pelo relógio e preso ao tempo, somos réus do dia que passa rápido, sempre ficando algo acumulado para o dia seguinte. A correria muitas vezes nos impede de vermos nossos filhos crescerem, pois ao sairmos de casa eles ainda estão dormindo e ao voltarmos já estão dormindo outra vez. Chegamos a sexta-feira, mais um fim de semana, reunimos a família, desligamos o celular e vamos todos a praia e veja que loucura, não é que tem horas que bate aquele incômodo por estarmos alí sem fazer nada, olhando o mar e curtindo os netos. Realmente estamos ficando no mínimo indiferentes a natureza, precisamos encontrar o tempo que nos foi roubado. Sejamos melhor gestores de nossa vida, aprendamos melhor a gerenciar nosso dia, apliquemos mais no bem estar da nossa família, invistamos mais em meditação, reflexão e no livre pensar, empreendamos mais no convívio com amigos e parentes. Fazendo tudo isso, com certeza o lucro virá acompanhado de dividendos de saúde e juros de felicidade. Um abraço, Armando. [recomentarios.blogspot.com]
Rosane, pelo menos estamos arranjando um tempinho pra rir em meio aos nossos afazeres, né? Bom demais....rs
Armando, seu comentário, como vários que li no seu blog, é muito pertinente. Vc tocou num outro ponto interessante: estamos ficando indiferentes à natureza. Vc percebeu que a maior preocupação hoje em dia quando nos deparamos com uma paisagem bonita? É fotografar. Guardar no computador, ou no papel, encher o computador de imagens, mas não retê-la na memória, olhando-a com calma, apreciando o momento. Vemos com as lentes da câmera, que pena...
Obrigada pela visita, novamente.
Abraços
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